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A virada de US$ 20 milhões: a história da maior apropriação de terras na Amazônia brasileira

Aug 04, 2023Aug 04, 2023

ALTAMIRA, Brasil — O armazém doado para abrigar o mercado de agricultores do Castelo dos Sonhos para produtores locais está vazio há quase 15 anos. Inaugurado em 2008 e com 480 metros quadrados (5.170 pés quadrados), o mercado dos agricultores nos arredores da cidade de Altamira, no estado do Pará, funcionou por apenas sete meses; simplesmente não havia açaí, mel, frutas ou vegetais suficientes para encher suas mesas. Desde então, o prédio está vazio, em total contraste com o ritmo agitado dos madeireiros, dos vagões de carne bovina e de soja que percorrem a rodovia BR-163, e do zumbido constante das motosserras, cujos operadores cautelosos emergiam da floresta tropical quando dirigíamos. ao longo das estradas de terra paralelas à rodovia.

“Não há nada para vender porque ninguém quer mais ser agricultor”, diz um morador local que pede para permanecer anônimo. “Algumas das pessoas que cultivavam ou colhiam alimentos cortam tábuas em serrarias; outros estão trabalhando para mineradores ou cortando árvores.”

Nesta parte do Brasil, o medo de se manifestar contra os grandes proprietários fundiários baseia-se num perigo muito real; uma ameaça comum aqui diz: “Se você não quiser vender o terreno, tudo bem. A viúva vende mais barato.”

Foi aqui, ao longo do trecho da BR-163 que liga os bairros de Castelo dos Sonhos e Vila Isol, no sudeste do Pará, que ocorreu a destruição da maior faixa contínua de Floresta Amazônica até hoje no Brasil. Uma área maior que Manhattan, este corte raso foi identificado pelo MapBiomas, um coletivo de pesquisa que rastreia mudanças no uso do solo por meio de imagens de satélite e usa sua plataforma para coletar e validar alertas de destruição de florestas tropicais desde 2019. O programa baseia-se em diferentes sistemas de monitoramento, incluindo o sistema DETER do instituto espacial brasileiro e o sistema de alerta de desmatamento do Imazon, um centro de pesquisa que promove a conservação e o desenvolvimento sustentável na Amazônia.

A área desmatada identificada pelos satélites cobre 6.469 hectares (15.985 acres) e foi criada entre fevereiro e maio de 2020. O custo para desmatar esta quantidade de floresta é estimado em nada menos que 2,5 milhões de dólares. As terras, que hoje estão em poder de grileiros, ficam em uma região que pertence ao governo federal brasileiro. O que antes era terra pública pertencente a todos os cidadãos brasileiros agora enche os bolsos de três homens que poderiam receber mais de US$ 19,7 milhões em lucro com sua venda e que infringiram a lei brasileira ao desmatar a floresta sem autorização dos órgãos ambientais.

O terreno fica no município de Altamira, mas o centro urbano mais próximo é o município de Novo Progresso, localizado em região que apoiou fortemente Jair Bolsonaro nas eleições presidenciais de 2022. Os distritos de Castelo dos Sonhos e Vila Isol (também conhecidos como “Quilômetro 1.000”), assim como o município mais amplo, têm uma elite econômica especializada na mineração de ouro, no desmatamento da floresta tropical para obtenção de madeira, no comércio de gado e, mais recentemente, na monocultura da soja.

“A soja cresceu nesta região como um câncer, como um vício. Não há como voltar atrás agora”, afirma Marcelo Reis, chefe do escritório local da EMATER, agência de desenvolvimento rural do Pará.

Os negócios desse trecho da BR-163 dizem muito sobre o perfil econômico da região: inúmeras lojas que compram e vendem ouro, lojas de insumos agrícolas e de rações e oficinas de conserto de pneus, tratores e retroescavadeiras – máquinas fundamentais para mineração e desmatamento.

Todos esses negócios foram fundados em uma coisa: a apropriação de terras públicas. “A grilagem é uma forma de trazer mais terras ao mercado”, diz José Heder Benatti, professor de Direito da Universidade Federal do Pará (UFPA) e ex-presidente do Instituto de Terras do Pará. “O que as pessoas fazem com esta terra depende do ciclo económico do momento.”

Nem mesmo duas forças-tarefa federais contra grandes desmatadores na Amazônia foram capazes de intimidar aqueles que se apropriaram ilegalmente de terras no sudoeste do Pará – a operação Castanheira em 2014, dirigida a um grupo liderado por Ezequiel Antônio Castanha, e Rios Voadores em 2016, que tentou quebrar montou um ringue liderado por Antônio José Junqueira Vilela Filho.